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sessão 317

quando bem moleque meu pai me levava no armazém de secos e molhados do seo salvador, naquele pedaço da carlos weber que já é considerado como vila hamburguesa. lá ele encontrava os amigos bucheiros, matava uns campari, comprava uns pacote de macarrão pra minha mãe e ainda uma bola algo plástica pra eu voltar pra casa driblando vento e tabelando com os portões das garagens dos sobrados da vizinhança 

os fins de tarde dominicais rolavam na saudosa delícia real pães e doces, localizada na rua schilling, quase uma faixa de gaza entre vila hamburguesa e vila leopoldina. campari pro meu pai no balcão (eu ia de gini), pizza assada por um simpático senhor espanhol pra levar pra casa e outra bola pra eu seguir zuano na rua

entre outros programas, os anos 80 proporcionaram infância rica e divertida pra esse que vos escreve. um dia ainda escrevo guia sobre lugares que não resistiram ao tempo, embora tenham deixado frutos e valores de juízo

na lapa botecos e panificadoras são pai e mãe dessa tal de globalização, filha ingrata

mas criamos filhos pro mundo, não pra nós mesmos

eu costumo voltar pro pedaço de 2 em 2 anos, em dia de eleição. inclusive no próximo dia 30 lá estarei novamente pra cumprir meu dever cívico no segundo turno

embora a escola onde estudei tenha se transformado em colégio militar e as antigas casas tenham dado lugar a cafonérrimos predinhos moemísticos esse tipo de atividade me divertia um tanto

a estação de trem onde aporto fica na rua guaipá, a umas 8 quadras do sesi, onde realocaram minha zona eleitoral e gostava de percorrer o caminho das ruínas das memórias que remetem ao milênio passado em direção a urna da seção 317

mas nesse último dia 2 de outubro o programa não teve a menor graça. pra começar que o restaurante do amigo que ficava nas proximidades fechou e sem substituto à altura pra almoçar pós-voto, o passeio perdeu boa parte do sentido

além disso, devido a problemas causados por falta de estrutura e organização, a fila do lugar de votação demorava um bocado

mais de 3 horas em pé na pouco sutil companhia de dezenas de cosplay do odiável neymar 

eu não tenho a menor vocação pra estar nessa tal da festa da democracia, muito pelo contrário

e não me reconheço mais nas ruas onde cresci

sem querer ser saudosista – tenho plena consciência de que meu quarto de século já passou há algum tempo – afirmo que a crise é acima de tudo estética

exemplo. sabe por que as padarias não existem mais tal como antigamente? porque as redes de supermercado passaram a vender pães e doces. horrorosos por sinal. mas é cômodo para as pessoas de plástico das novas gerações

agora senti que ia foder de vez quando barbeiro passou a vender cerveja especial. não falo nem do óbvio perigo médio que as tesouras etílicas podem trazer, mas do péssimo gosto da coisa mesmo

e não adianta resistir. eles sempre estarão em maior número

mas podemos e devemos ser mais legais no mínimo dentro de nossas bolhas

e não tenha medo de sair na rua também. eles venceram, mas pouco importa. 

a vista aqui da sarjeta é mais divertida e avista nova primavera vindo lá no fim do horizonte

podem nos destruir, mas jamais tirarão nosso otimismo

viva o romantismo e abaixo os cretino tudo.

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