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Alphaville XII

Toda vez que um comércio pequeno fecha eu morro um pouco junto com ele. Ontem passei na frente da Merça e observei meia dúzia de náufragos com seus engradados e isopores bebendo o defunto do outro lado da rua.

Triste fim da história de um divertido bar frequentado por mais autores que leitores. Se alguém jogasse uma bomba ali numa noite mais agitada, boa parte da cena literária nacional iria pro brejo.

Mas não precisou disso, não. A especulação imobiliária cuidou pra que muitos não conseguissem sequer comer o último pastel, que aliás era bem gostoso.

Esse mesmo modus operandi tira do endereço onde está há quinze anos o bom restaurante de uma celebrada chef televisiva para o colocar no térreo de um prédio no bairro vizinho, aumentando consideravelmente o seu tamanho. Situação parecida ocorrerá com meu português preferido na cidade.

Se você seguir o caminho do dinheiro, checará facilmente que o mercado imobiliário não tira nada da cidade, mas sim capitaliza transformando comércios pequenos ou médios em grandes empresas pasteurizadas.

As condições de trabalho são cada vez mais complicadas e é difícil resistir. Quem não gostar que vá comer no Oxxo.

Nessa semana mesmo vi a possibilidade de transformar um bar que não vai muito bem em um novo negócio. A situação travou quando soube que o contrato de locação vence em outubro. Porque se o dono do imóvel não oferecer novo contrato de cinco anos, não vale a pena investir. E o português já deu sinais que prefere deixar de receber o aluguel enquanto espera calmamente pela venda da quadra inteira.

E assim vamos moemizando o pedaço, assistindo inofensivamente tudo ao nosso redor se transformar num grosseiro condomínio a céu aberto.

Não precisamos ir a Barueri, Barueri já está entre nós. Foi esfaqueado na chegada, mas passa bem.

E antes que alguém me cancele de novo, eu adoro Barueri, cidade onde passei anos entregando carne em açougues tanto no centrinho quanto também em simpáticas vilas um pouco mais distantes. Não precisa se esforçar muito pra entender pra onde é a crítica.

Então espere a sua vez pra discutir. Até porque num futuro mais próximo do que você imagina todos serão cancelados por não mais que quinze segundos, pois a máquina precisa continuar a rodar.

Não adianta nem tentar fugir de Uber, porque o motorista foi robotizado e hoje respira se comunicando com o mundo apenas através de aplicativos movidos a estupidez artificial. Por quantas vezes você não travou conversas parecidas com Moço, minha casa ficou na quadra de trás! Não, não. O waze mandou te deixar aqui!

O que não tem solução, solucionado está. Mas chegamos numa encruzilhada e há duas alternativas de caminho para seguir. Eu, que me recuso a ter comportamento de gado, já escolhi por onde vou.

Independente de suas escolhas, se me permite uma sugestão, resista também

Porque a vida pode ser até mais dura, mas lhe garanto que podemos nos divertir mais do lado de cá.

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